Magno Bacelar: primeiras histórias…

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Coelho Neto no passado: palco da infância do menino Magno Bacelar

Décimo primeiro, dentre os dezoito  filhos,  de Maria e Duque Bacelar, nasci no ITAPIREMA ano, da Graça de Deus, de 1938. Meus pais e irmãos me esperavam ansiosos como o sertanejo aguarda a chuva e eu cheguei, no meio dela, no mês de fevereiro.

Tive uma primeira infância muito rica de amor e carinho, fui amamentado até aos dois anos de idade. Ao tempo em que a natureza era pródiga em compensar, com fartura e abundancia, o trabalho de homens e mulheres.

Os  mais velhos já estudavam fora enquanto os menores permaneciam na casa grande recebendo os primeiros ensinamentos através das professoras leigas ali residentes e remuneradas para isso. Por estar situada distante da cidade no   ITAPIREMA  seguia-se  uma regra: – o que hoje representa a pré-escola era feita em casa; o ensino fundamental no grupo escolar de Coelho Neto, o  ensino médio em São Luís e Faculdade no Rio. Os meus pais, que não tiveram a oportunidade de frequentar escolas, elegeram como meta principal a educação dos filhos. Vitoriosos transforam o sonho em realidade.

Os primeiros anos vividos um tanto isolado, no ambiente da fazenda, mais próximo dos pais e irmãos alicerçaram, em bases muito sólidas, o espírito de família.  Envolto na pureza amena de Dona Maria e amparado pelo pulso forte do  Duque,  cheguei ao fim da primeira etapa. Foi muito importante a convivência com todos aqueles que laboravam   e faziam parte daquele mundo de sonhos e felicidades. DEUS me concedeu a dádiva de absorver os ensinamentos de cada um.

Completada a primeira etapa, 9 anos de vida, tomado de um misto de ansiedade e medo, supunha eu estar preparado para empreender novos vos. Outros irmãos haviam iniciado por Teresina, mas a mim havia sido destinado o Maranhão.  É isso mesmo, o transporte difícil, as   distancias tão grandes e as dificuldades nas comunicações, levavam os  antigos a ver a nossa capital de maneira remota e a ela se referiam  como “Maranhão”.  Portanto lá vou eu “rumo ao Maranhão”.

A viagem, em si, já se constituiria uma extraordinária aventura. Iniciava com a composição de uma caravana. Com de um pajem,  homem vigoroso e de extrema confiança,  responsável por todos, inclusive os animais de montaria e carga.  Os viajantes, devidamente munidos de lanterna, chapéu e demais acessórios inerentes  à  grande empreitada. Saia-se do ITAPIREMA às quatro horas da manhã com destino à Caxias onde deveríamos chegar no dia seguinte por volta das quatro da tarde. A primeira parada, em condições normais, deveria ser feita às onze horas da manhã, quase sempre às margens de um riacho ou à sombra de uma arvore. Aí comia-se o frito carinhosamente preparado, bebia-se água, e descansava-se enquanto o IZIDORO (o pajem) dava água e lavava os animais. Parada técnica de duas horas aproximadamente.

Animais arreados todos montados iniciava-se a segunda etapa, um pouco mais difícil pelo calor do início de tarde e pelo cansaço.  Cavalgava-se até às  dezoito horas parando apenas onde deveríamos pernoitar. Habitualmente   na casa de amigos ou conhecidos dos meus pais.

No segundo dia repetia-se o mesmo ritual sendo que as crianças estavam mais animadas para enfrentar as duas etapas finais. Chegava-se a Caxias ao entardecer direto para o Hotel da Benedita, às margens da estrada de ferro. Hospedados, banhados e alimentados esperávamos o trem do dia seguinte.

O terceiro dia iniciava-se cedo na estação ferroviária onde embarcava-se para São Luís. Esta viagem, do dia todo, merece um capítulo à parte uma vez que já foi até tema de música de João do Vale interpretada por Luís Gonzaga. Agora tenho que chagar ao Maranhão pela primeira vez e o IZIDORO tem que voltar a Coelho Neto prestar contas da sua missão que findava ali.

Pois bem, lá estava eu no trem, aos nove anos, embevecido com tudo, admirando tanta gente junto a um só tempo. Em Codó e Coroatá entraram meninos e mulheres com seus matulões de onde retiram pratos de alumínio e uma colher ao tempo que apregoavam: almoço, almoço e diziam o preço. Só muito depois entendi que as vasilhas eram de alumínio para não quebrarem. Tudo tinha que ser muito rápido pois a demora do trem era mínima. O pagamento tinha de ser adiantado. Recolhido o prato, forneciam um copo d’água que nunca ninguém conseguia beber pois o trem já estava em movimento.

Fui alvo de gozações por ser marinheiro de primeira viagem. Quando chegamos a Rosário novos gritos e invasões de vendedores que ofereciam frutas e “bilha d`água”. Paguei mico por não saber o que era bilha d’água. Já na ilha começaram a dizer que, para conhecer o mar, eu teria que salivar uma pedra de sal.

Finalmente, por volta das vinte e uma horas, cheguei à bela São Luís, conheci, ao mesmo tempo o mar e o fogo.  Pois, tempos depois, carregado de tonéis de combustível, o navio cargueiro Maria Celeste seria consumido pelas chamas.  Ainda não tínhamos porto e os navios ficam ao largo em frente ao Palácio e à estação da Estrada de Ferro.

Era o início do ano de 1947, o fim de minha primeira viagem e início de um grande amor pela ilha que seria palco da história de minha vida. Vamos contar tudo que você gostaria de saber.

COM CERTEZA.

*Magno Bacelar é ex-deputado estadual, ex-deputado federal, ex-vice-prefeito de São Luís, ex-senador e ex-prefeito de Coelho Neto.

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