AS TOCHAS DE CHEGADA

AS TOCHAS DE CHEGADA


Por José Sarney 

É dos gregos a invenção do simbolismo da tocha. É um símbolo de vitória, de chegada. Também deles é o provérbio de que as coisas são boas quando terminam bem.
Terminei um ciclo de minha vida esta semana quando concluí meu mandato de presidente do Senado que por quatro vezes fui investido e por oito anos exerci. Confesso que estava feliz e como em toda felicidade, atravessei uma carga de emoção. Afinal, durante 56 anos estou no Congresso Nacional. Sou o mais longevo político da história republicana, o que por mais tempo permaneceu ativo na história da República, tendo ocupado todos os postos políticos do país.
Deputado federal três vezes, vice-presidente e presidente da República, senador cinco vezes e presidente do Senado e do Congresso Nacional (reunião das duas Casas, Câmara e Senado), também. Tudo isso, com as vicissitudes dos cargos, turbulências, injustiças, xingamentos, insultos, invejas e essas coisas mais da maldade humana. Mais nada de amargura. Encaro a vida como uma graça de Deus e todo dia tenho gratidão por ela. Dediquei toda ela a serviço do meu país, pude ajudá-lo incorporando-me à sua história. Presidi a transição democrática, convoquei a Constituinte, fui o primeiro a jurar a Constituição de 1988, que implantei e é a mais duradoura da história republicana, completando 25 anos este ano, sem nenhum momento de exceção ou de sombreamento da democracia.
A implantação dos direitos sociais, individuais e civis que hoje desfrutamos, no exercício da verdadeira cidadania. Foi durante meu governo que demos o passo mais decisivo para a melhoria da qualidade de vida do povo quando criei a universalização da saúde, isto é, a proteção de saúde do Estado a todos, desde o nascimento até a morte. Hoje, a saúde não é totalmente satisfatória, mas é uma proteção do Estado. O salário-desemprego, o salário-alimentação, a proteção de não deixar penhorar a casa própria, os direitos do consumidor, a distribuição de livro escolar e a merenda, liberdade de imprensa com o término da censura, foram ações praticadas por mim.
No Congresso, que encontrei no século XX com as atas escritas a mão, deixei totalmente informatizado, com absoluta transparência, TV Senado, transmitida em 11 estados e deixei os transmissores comprados para sua implantação no Maranhão, Rádio Senado Federal, retransmitida por 2.000 emissoras em todo o Brasil, Portal da Transparência. Sempre fui um homem do meu tempo. Nunca tive olhos para o vazado nem para vingança. Sempre para o futuro, estudando, me atualizando e me adaptando às novas idéias e tecnologias.
Já escrevi 146 títulos, entre livros, ensaios, avulsos, plaquetes. Sou o decano da Academia Brasileira de Letras, onde ocupo a Cadeira 38, que tem como fundador Tobias Barreto e ocupada por Santos Dumont. Tudo isso passava pela minha cabeça quando entregava a presidência do Senado. E pude viver e cumprir com meu destino sem passar por cima de ninguém e dizer como Lincoln: “Nunca cravei, por meu desejo, espinho algum no peito de ninguém”.
Do Blog do Gilberto Leda

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