Coluna Falando DIREITO: Desconfiguração do crime de desacato…

*Por Lucas Crateús

Olá pessoal, tudo bem com vocês? Estou de volta e hoje vou falar um pouquinho sobre uma decisão bem recente da 5º Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), tomada em meados de dezembro de 2016, que desconfigura o crime de desacato (art. 331, do Código Penal).

Desacatar significa “menosprezar a função pública exercida por determinada pessoa. Em outras palavras, ofende-se o funcionário público com a finalidade de humilhar a dignidade e o prestígio da atividade administrativa.” (MASSON, Cleber. Direito Penal esquematizado. 4ª ed., São Paulo: Método, 2014, p. 748).

Há muitos anos, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) vem decidindo que a criminalização do desacato ofende o artigo 13 do Pacto de San José da Costa Rica.

Artigo 13 do referido Pacto. Liberdade de pensamento e de expressão

  1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.
  2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito a censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei e ser necessárias para assegurar:
  3. o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas; ou
  4. a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral públicas.
  5. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e opiniões.
  6. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2.
  7. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência.

Em resumo, de acordo com o próprio Relator Ministro Ribeiro Dantas, “para a CIDH, as leis de desacato restringem indiretamente a liberdade de expressão, porque carregam consigo a ameaça do cárcere ou multas para aqueles que insultem ou ofendam um funcionário público. Por essa razão, este tipo penal (desacato) é inválido por contrariar o artigo 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos.” (GRIFO NOSSO)

Nesse sentido, por decisão unânime da 5ª Turma do STJ, o crime de desacato não mais subsiste em nosso ordenamento jurídico. O Relator, em seu voto, afirmou que a criminalização do desacato está na contramão do humanismo, porque ressalta a preponderância do Estado, personificado em seus agentes, sobre o indivíduo.

A existência deste crime em nosso ordenamento jurídico é obsoleta, pois traduz desigualdade entre funcionários e particulares, o que é inaceitável no Estado Democrático de Direito preconizado pela CF/88 e pela Convenção Americana de Direitos Humanos.

Vale a pena ressaltar que o funcionário público que se sentir lesado, pode buscar enquadrar o ofensor para que este responda por calúnia, difamação ou injúria, a depender do caso concreto.

*Lucas Crateús da Luz é advogado, graduado em Direito pelo Centro de Ensino UNINOVAFAPI e assinará a coluna neste blog as terças-feiras.