OS MAGNATAS DO PIAUÍ: PEDALA CLAUDINO

OS MAGNATAS DO PIAUÍ: PEDALA CLAUDINO
De uma pequena loja de tecidos no sertão, o Grupo Claudino, do Piauí, virou um gigante de R$ 1,9 bilhão

Por Eliane Sobral

Um tinha jeito para lidar com as pessoas. O outro era bom de números. Em 1958, João e Valdecy Claudino, nascidos em Cajazeira, no sertão paraibano, resolveram juntar suas habilidades e abriram uma acanhada loja de tecidos pelas bandas de Bacabal, no interior do Maranhão.

Pacientemente, ao longo dos últimos 53 anos, os irmãos Claudino transformaram o pequeno Armazém Paraíba numa das maiores redes varejistas do Nordeste, com mais de 300 pontos de venda espalhados, principalmente pelo Piauí, onde a família fincou bandeira. Na esteira do crescimento do Armazém a dupla de sertanejos, com escassa educação formal, foi diversificando suas atividades.

João Claudino Fernandes Jr: um dos maiores varejistas do Nordeste, o empresário se prepara para defender

o território ao mesmo tempo que ataca no mercado das bikes

A carência de diplomas de escolas de administração, MBAs e outros que tais foi suprida por muita intuição – ninguém por aquelas bandas tinha a menor noção do que era feeling. Faltavam móveis para vender nas lojas? Pois abriram uma fábrica de móveis. Os clientes queriam comprar colchões? Os Claudino montaram uma fábrica de colchão. Estava difícil transportar as mercadorias adquiridas para suprir o Armazém, do Sudeste para o Nordeste (imagine o tamanho do problema meio século atrás)? Pois não demorou muito para eles abrirem uma transportadora.


O resumo dessa trajetória é um conglomerado com interesses na indústria, no comércio, no setor de serviços e no financeiro que faturou R$ 1,9 bilhão no ano passado. “Somos grandes, mas ainda temos muito espaço para crescer”, afirma João Claudino Fernandes Júnior, um dos cinco filhos de João Claudino e executivo do grupo.

Com um olho no varejo e outro na indústria, os Claudino têm duas prioridades para 2011. Estão investindo R$ 238 milhões na expansão do Teresina Shopping, na capital do Estado, que passará das atuais 106 lojas para 332, com 12 âncoras (há um segundo shopping em São Luís, no Maranhão). Outros R$ 40 milhões serão empregados na construção de uma nova fábrica da Houston, a marca de bicicletas do grupo.

Mais do que engordar o caixa da família, o centro de compras, que já é o maior do Piauí, é a principal trincheira dos Claudino diante das tentativas de avanço de outras potências varejistas sobre seus domínios. A principal ameaça atende pelo nome de Máquina de Vendas, resultado da fusão da rede Insinuante, da Bahia, e da mineira Ricardo Eletro. “Essa fusão representa uma ameaça concreta ao grande varejo regional e os Claudino estão se preparando para uma briga que será intensa nos próximos anos”, diz Heloísa Omine, professora de pós-graduação da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

Embora não tenha o peso dos shop-pings e do Armazém Paraíba para os negócios, a Houston parece ser a grande aposta estratégica dos Claudino. A fábrica atual, instalada em Teresina, onde fica o QG do grupo, tem capacidade para produzir 1,1 milhão de bicicletas por ano e está bem próxima de alcançar essa marca. Em Manaus, onde está sendo construída a nova planta, a capacidade de produção será de 650 mil unidades por ano e a expectativa do grupo é começar a operá-la em julho de 2012.

No ano passado, segundo Claudino Jr., foram vendidas 750 mil unidades da Houston e a meta é fechar 2011 com pelo menos 20% de crescimento. Pelas contas do empresário, a produção total de bikes no Brasil vai bater na casa dos 5,5 milhões – cerca de 100 mil unidades a mais que o produzido em 2010. “Caminhamos muito rapidamente para ocupar a liderança desse mercado”, afirma.

É difícil saber quanto ainda falta para atingir esse objetivo, mas o fato é que, com apenas dez anos de mercado, a Houston já causa dor de cabeça à líder do setor, a tradicional Caloi, de São Paulo. “Como esse é um mercado muito pulverizado, com pequenas fábricas e muita importação de peças, é difícil apontar a participação de mercado de cada marca”, afirma Moacyr Alberto Paes, diretor-executivo da Abraciclo, a entidade que representa fabricantes de veículos de duas rodas.


Embora façam parte do seu portfólio marcas como o jeans Ônix, vendido em todo o País, seguramente a Houston é a face mais conhecida do grupo Claudino, em nível nacional. E os Claudino não têm poupado esforços para que isso aconteça. Só no ano passado, a empresa investiu R$ 10 milhões em uma única ação de marketing: a fábrica da empresa, em Teresina, serviu de cenário para a novela Passione, da Rede Globo. O grupo gostou da experiência e resolveu repetir a dose: a Houston acaba de fechar merchandising na novela Rebelde, em exibição pela Rede Record.

“Quando entramos em bicicletas, dez anos atrás, fizemos um trabalho de formiguinha para tornar a marca conhecida e ganhar espaço num mercado dominado por uma marca só”, lembra Claudino Jr. O trabalho de formiguinha a que ele se refere foram as excursões de varejistas do Sul e do Sudeste a Teresina. “Não há melhor maneira de promover o seu produto que levar seu cliente para ver como ele é produzido”, afirma Claudino Jr. Segundo ele, nos últimos seis anos, a Houston levou mais de 1,4 mil varejistas do Brasil inteiro à capital do Piauí.

Como resultado das estratégias desenvolvidas para a Houston, o empresário cita a inversão geográfica das vendas. Setenta por cento das vendas, em 2010, foram realizados no Sul e Sudeste – São Paulo respondeu por 40% desse total. O empresário diz não ter a menor intenção de expandir as atividades do grupo para além das fronteiras nordestinas.

“Primeiro, porque nossos negócios são muito diversificados, segundo, porque estamos muito bem consolidados num mercado que só agora começa a florescer”, diz ele em referência à expansão do consumo no mercado nordestino, o que mais cresce no País (ver reportagem na página 66). Pelo menos no caso das bikes, não é bem assim. Há uma década, no mínimo 80% das bicicletas vendidas na região eram usadas para transporte. Até por conta da melhora no poder aquisitivo, as bikes passaram a sofrer a concorrência das motos. Hoje, segundo Claudino Jr., as bicicletas mais robustas representam apenas 1/3 da produção da Houston.

Os irmãos Claudino não foram pródigos só na ampliação dos negócios. Seu João, hoje com 81 anos, tem cinco filhos e seu Valdecy, um ano mais velho que o irmão, tem quatro filhas. Ambos fazem parte de uma família de 16 irmãos. “Só primos, eu tenho 76. Antigamente, as reuniões da família aconteciam no Carnaval e a gente tinha bloco próprio, com camiseta personalizada e tudo”, lembra Claudino Jr. Os dois fundadores ainda acompanham os negócios de perto, mas quem toca o dia a dia, são os herdeiros.

Preocupados com a sucessão familiar e a divisão do patrimônio entre uma prole tão grande, os irmãos Claudino separaram os negócios em 2003. Valdecy ficou com a Socic (Sociedade Comercial Irmãs Claudino), que abriga os negócios de transportes, a administradora de cartões de crédito e um shopping. João ficou com o grupo Claudino, que controla o Teresina Shopping, a Houston e o Armazém Paraíba.

Ao contrário dos patriarcas, os herdeiros dos Claudino tiveram uma formação profissional esmerada. Aos 16 anos de idade, Claudino Jr., por exemplo, mudou-se para São Paulo onde estudou economia e administração. Depois foi fazer pós-graduação nos Estados Unidos, onde morou por cinco anos. Aos 42 anos de idade, comanda o império erguido por seu pai e seu tio, que emprega 16 mil funcionários.

Foi o pai quem mostrou a força do grupo ao Brasil. Em 2007, quando o então presidente da Phillips do Brasil, Paulo Zottolo, declarou que se o Piauí sumisse do mapa, ninguém perceberia, seu João ordenou um boicote dos produtos da marca holandesa em todas as lojas e shoppings do grupo. Não teria maiores repercussões se o grupo Claudino não estivesse, já naquela época, entre os cinco maiores clientes da Phillips no Brasil. Zottolo se retratou. Inflexível, seu João demorou anos para revogar a punição.

Da Revista Isto É Dinheiro

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